Há uns quatro anos atrás fui
trabalhar fora de São Paulo, para a família de um banqueiro, era um banqueiro
local, alguém provinciano e pequeno em comparação com um Setúbal ou um Amador
Bueno, mas como todo bom sujeito provinciano era pretensioso e arrogante.
A arrogância era fruto da sua
riqueza, da posição que ele e a família ocupavam na cidade e na comunidade
local, em verdade eu poderia ter sido poupado de ter conhecido tal figura, mas
a pessoa que me contratou exigiu que eu conhecesse o gênio financeiro da
família, e não tive escolha.
Com a pompa de quem pensa ser um
Rockfeller ou um JP Morgan, o banqueiro me recebeu em uma sala escura decorada
com certo bom gosto, mas verdadeiramente soturna, não havia janela ou qualquer
coisa que remetesse a ideia de se estar um edifício ou lugar algum, parecia
lugar nenhum.
O banqueiro me recebeu ao lado de seu
familiar e de pronto me alertou, “não sou um homem de palavras, sou um homem
que acredita em ação” e continuou, sabendo que falava com um professor, como
quem alerta e ao mesmo tempo busca orientar pelo justo e reto caminho da
verdade, que de certo me conduziria á plagas mais paradisíacas do que aquelas
em que sempre vivi, “gente que fala e pensa muito não serve, eu mesmo já li
muito, e odeio estes escritores que ficam fazendo a louvação das palavras.”
É certo que eu estava um tanto enjoado,
para não dizer contrariado de ficar ouvindo o tal banqueiro, e para minha
surpresa ele disse, “eu acabei de ler um livro, (havia ganhado de aniversário
de algum desavisado) um tal de Carlos Fuentes, ( o livro era Este é meu Credo por mais que tentasse
não conseguia lembrar o título, e eu fiquei chutando alguns títulos até ele se
lembrar) o camarada faz uma apologia da
palavra, um chato, não sabe nada, - arrematou com uma certeza- este homem nunca
soube o que é ganhar dinheiro. Por isso não tolero palavras, eu gosto de quem
faz, porque as palavras se perdem, mas a ação não.”
Na avalanche de estultices, me
controlei, apenas argumentei com o banqueiro se ele não concebia haver neste
mundo pessoas que tivesse outras tantas preocupações e interesses capazes de
serem mais sedutores que apenas ganhar dinheiro, e se as palavras fossem este
vazio, e todos assim acreditassem o que seria da nossa civilização? Um punhado
de homens e mulheres incapazes de acumular saberes pelo simples fato de não
fazerem o registro de tudo o que aprenderam durante a vida. Argumentei para não
ser respondido, afinal, que era eu para aquele homem? Um nada ou quase nada.
Carlos Fuentes foi sendo execrado com
todos os intelectuais, em uma torrente de petulância ignorante e associado a descabida
pretensão do banqueiro do alto da sua superior capacidade de saber o que é á
vida e como trata-la.
O grande escritor morreu ontem,
quinze de maio, deixou um legado imenso para a humanidade, e este perdurará por
séculos a fio, Fuentes será lido e relido por gerações e gerações para saber
quem foram os mexicanos do século XX, e os homens e mulheres latino-americanos,
para saber como pensavam os homens de um tempo passado, de um tempo importante
para a formação de uma nação, uma identidade e uma cultura. Envolto na maestria
lírica das palavras e em um profundo conhecimento de si e do seu tempo nos
legou maravilhas a quem puder entender. E o banqueiro é idiota demais para
saber do que estou falando.
Quanto ao banqueiro eu não faço ideia
do que aconteceu, mas quando se for vai deixar que legado? Um testamento bem
redigido, e um punhado de coisas efêmeras, dinheiro, carros, casas enfim coisas
efêmeras do mesmo jeito que ele tolamente acreditava serem as palavras, eternas
palavras.
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