quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Um dia de Fúria e Tragédia

Que o magistério não é o paraíso todos nós sabemos a muito tempo, alunos sem a menor educação formal, professores infelizes com salários miseráveis em escolas horrendas em uma vida com perspectivas cada vez mais distantes de realizações e bem estar. Ser professor não é sinal de status, é sim sinal de falta de opção melhor, a sociedade parece olhar o professor como um pobre coitado pseudo qualificado e com profundas deficiências. 
Veio a público hoje, 30 de setembro, dois momentos de horror em sala de aula, um professor de ensino médio de uma escola pública no litoral paulista gritou que não aguentava mais os alunos, quebrou mesa, porta e ao tentar se contido por uma colega, á agrediu.
Na universidade federal do Espírito Santo um professor de jornalismo, em meio a um debate com os alunos, e uma discussão com eles, destruí uma mesa e um laptop e falou uma quantidade razoável de impróprios antes de se retirar da sala.
Evidente que estes momentos de stress severo vivido por professores é algo que todos educadores podem passar, a questão é que a reincidência hoje é cada vez maior e mais persistente, associado a uma sociedade cada vez mais próxima do big brother de George Orwell, onde todos gravam, fotografam e filmam todos. Tudo junto parece ecoar mais alto uma crise profunda no magistério, uma sensação de profundo empobrecimento da vida escolar.
Nada pode justificar a agressão no ambiente escolar, seja ele de quem for, porém é preocupante pensar nestes casos quase rotineiros, e na mesma medida, não vejamos nada sendo feito, o governo do Rio de Janeiro tornou pública uma estatística na qual 4 a cada 10 professores da rede oficial estão afastados, e destes 4 pelo menos 2 se afastaram porque simplesmente se sentem esgotados com a sala de aula. O poder público e a sociedade parece apenas contemplar a tristeza que assola a escola.
Coincidentemente ontem na grande São Paulo um aluno de apenas 9 anos foi morto com um tiro a queima roupa, ou seja, a uma proximidade mínima, dentro de uma sala de aula, após seu término, detalhe, é uma escola particular e confessional. É possível deduzir que este aluno foi morto por outro aluno? Tudo leva a
crer que sim. E se for verdade revela o tamanho da nossa crise e infelicidade que rodeia a escola, se provar que outra criança foi a autora do crime se fará necessária uma reflexão mais ampla, afinal porque na escola? Como uma outra criança tem uma arma em suas mãos? Como se entende uma criança matando outra? sim, porque explicação não pode haver, apenas um parco entendimento.
O pior que pode acontecer é nós educadores acreditarmos que isto tudo, dias de fúria, mortes absurdas de crianças possam ser tratadas como coisas normais,  a banalização do mal é o primeiro passo para a barbárie, e a decadência. 

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O material didático

Existe um quantidade enorme de materiais didáticos disponíveis no mercado brasileiro, e ainda há uma equipe no MEC especializada que avalia quais livros devem ser comprados pelo poder público e distribuídos gratuitamente aos alunos. Evidente que temos materiais didáticos de boa qualidade, porem como tudo há uma limitação na maioria deles, não vamos aqui dar como exemplo o material comprado no ano passado pelo governo do estado de São Paulo que tinha erros absurdos de geografia e português, ficamos apenas com aqueles que são  metodológica e cientificamente bons naquilo que se propõe.
De uma forma geral estes materiais respondem a uma proposta curricular e, portanto, faz escolhas de o que se irá aprender e  indica como isto se dará. O problema está justamente quando o material didático se torna ele, e só ele todo o currículo da escola, se adquiri um material apostilado, de um sistema de ensino, ou um livro didático e ele se torna meio e fim curricular, "dado" do começo ao fim para que se justifique a sua compra, simples assim. O material didático é o currículo.
É este um dos maiores erros cometidos pela escola, de certa forma ele se explica por um conjunto de razões, mas eu destacaria o papel do professor e da direção da escola, ambos incapazes de assumir pedagogicamente a  escola sentando comodamente em um monte de papel e acreditando assim estar educando e formando o aluno.
Qualquer aluno de pedagogia sabe que um livro ou um conjunto de apostilas não é em si a definição de um currículo escolar, mas na prática é isto que se vive na maioria das escolas. A má formação dos educadores tem no livro didático uma benção salvadora, afinal, está tudo nele, ou quase tudo.
Do outro lado, é fato que não existe mais grandes manuais que orientem a vida escolar, recordo que nos anos noventa fui convidado por uma grande editora paulista para avaliar um conjunto de livros italianos para o ensino médio, eram manuais de geopolítica e história geral que traziam ainda discussões entremeadas de literatura e filosofia. Minha conclusão foi que aqueles manuais poderiam ser usados nos primeiros anos de um curso de ciências humanas, mas não não ensino médio,  o mercado brasileiro, seus professores e nossas escolas, ou poucas delas, poderiam fazer uso deste material. Na mesma época a professora Marilena Chauí lançou um livro de introdução a filosofia, um belo manual, voltado para o médio, e hoje ele é largamente usado em faculdades.
Estou convencido, a questão não está no material, mas sim na escola, em seus educadores, no baixo nível de exigência deles, na zona de conforto e na resignação de que quanto mais "simples" e medíocre o material didático melhor para os alunos, ou não seria melhor para o professor?

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O fim do Ensino Fundamental 2 e Médio



A nossa escola dividi-se  em três ciclos, de 1º a 5º ano,  de 6º a 9º ano e o ensino médio, o primeiro ciclo dedicado à formação das crianças e o último aos adolescentes, o problema  está no meio, na zona cinzenta e esquizofrênica do antigo ginásio. Quando eu e você estudamos, a adolescência chegava por volta dos 13, 14 anos de idade, o ginásio era, ainda, um lugar mais de crianças ou pré adolescentes, em suma um lugar mais infantilizado, e até hoje a sua estrutura é muito parecida com o que havia no passado.
A questão é que os alunos estão chegando a adolescência cada vez mais cedo e com valores e visão de mundo muito diferente daquela que se pensou a priori da construção curricular e metodológica do ensino fundamental. Há uma pressão dos alunos, em especial nas duas últimas séries, 8º e 9º anos, para que eles sejam tratados como os alunos do ensino médio, via de regra com mais abertura e liberdade por parte da escola, com um ambiente mais flexível e menos infantil.
A realidade nesta faixa etária se mostra cada dia mais complexa e exigente de professores e de educadores, boa parte dos problemas mais graves e incisivos de disciplina se dão nestes quatro anos de transição entre a infância e a adolescência.
Acredito que a melhor estratégia pedagógica e educacional seria nós repensarmos este segmento, e mudá-lo radicalmente, ou seja, dois primeiros anos introdutórios, com as disciplinas básicas, português, matemática, história, geografia, ciências, inglês e artes, e ainda, aulas de educação sexual, teatro e outras tantas disciplinas em um conjunto no qual os alunos pudessem escolher duas ou três como optativas. 
Afora isto a geografia das salas de aula deveria ser alterada, colocando fim às carteiras individuais e optando pela colocação de mesas coletivas na qual os alunos se sentariam, dividiriam e compartilhariam todo trabalho de sala de aula. Esta nova geografia e arquitetura se manteria até o final do ensino médio, com isto se altera a percepção do espaço escolar e da aprendizagem, como no mundo do trabalho, um espaço de trocas e de solidariedade intelectual entre grupos e entre todos.
Os dois anos seguintes seriam já o ensino médio, teria uma estrutura curricular com um conjunto de disciplinas básicas mais física, química e literatura e mídias. Ao final deste segundo ano o aluno teria uma estrutura curricular aberta na qual seria obrigatório apenas português, matemática, literatura, inglês e história, as demais seriam disciplinas optativas que deveriam ser escolhidas até um determinado número para compor o currículo do aluno. 
O espaço aqui não permite que sejamos mais profundos na proposta, mas antes que alguém pense que tal coisa é absurda, afirmo que já o realizamos em uma escola em que dirigi, e quando se quer, tudo é possível, acercado de bons profissionais e famílias interessadas.

PS: não tocamos aqui na questão do material didático que fica para a próxima postagem.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Escola em Tempo Integral

Este é o mote da campanha eleitoral deste ano, ou pelo menos os candidatos estão repetindo o tempo todo    escola em tempo integral, seja para presidente, seja para o governo do estado, em especial São Paulo, onde moro, e claro que todos nós somos a favor de uma escola maior e mais dedicada ao aluno, e a questão não é esta, é outra, é COMO?
Como o executivo irá fazer é a grande questão, pois senão vejamos, Para que você dobre o tempo de permanência dos alunos na escola, de míseras quatro horas diárias para sete ou oito horas, será preciso construir mais escolas, ou seja, será necessário um investimento gigantesco em infraestrutura, quantas escolas mais somente o estado de São Paulo e as prefeituras terão que construir para poder absorver estes "novos" alunos? Não tenho os números, mas sei que serão muitas, ou será que o poder público vai apinhar os alunos no pátio contratar estagiários para dar recreação aos alunos? Não duvido que isto ocorra. E mais, nossas escolas tem uma arquitetura horrível, em sua imensa maioria são feias, pequenas, desconfortáveis, em todos os sentidos, quando não são sujas. Faltam salas adequadas, bibliotecas, salas multimídia e quadras, no plural, poliesportivas. 
Ao aumentar a carga horária será preciso também contratar mais professores, e mais pessoal, como sabemos com os salários atuais, e falta crônica de profissionais, vai ser um tremendo desafio, ou será que o brilhantismo dos nossos administradores dará um "jeitinho" colocando estagiários, alunos, para ministrar aula? Eu não duvido, é barato e dá voto.
Um outro ponto é observarmos a condição curricular atual das escolas, decididamente ela não é boa, um currículo equivocado, por vezes extenso e que oferece um monte coisas dispensáveis, o que faremos? Uma reforma curricular? Seria ótimo para o Brasil, mas eu duvido, pois para isto é necessário uma dose extra de ousadia, algo digamos, muito em falta na coisa pública brasileira.Ousadia para transformar radicalmente a estrutura da escola, recompondo a sua base epistemológica.
As pessoas que detém o poder em nosso país parecem desconhecer por completo o que é a escola e quais as suas necessidades, uma escola pública de qualidade, precisa ser pensada a partir de seu currículo e do modelo de aprendizagem, e esta discussão passa anos luz dos debates públicos.
Em meio as estes pequenos detalhes, apenas citados aqui, como acreditar que teremos escolas em tempo integral? Sendo ingênuo ou desinformado. 
Eu gostaria de ser otimista, mas eu não consigo.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

O Apagão que nos Espera

Somos nação pródiga em situações inusitadas, seja pela absurdo que muitas vezes revestem a realidade brasileira, seja beirando a piada, seja pela tragédia, em sua maioria todas elas são anunciadas. Estamos a ponto de viver mais destes momentos absurdos da vida brasileira, um apagão educacional.
A cada ano que passa menos cidadãos deste país desejam ser professor, e em especial em algumas áreas do conhecimento, e no ensino médio já faltam professores, geógrafos, químicos e físicos são parte mais evidente deste quadro. Por um lado formamos um número pequeno destes profissionais, e por outro lado, e mais grave, a maioria dos jovens que terminam a sua formação buscam a profissionalização, ou simplesmente a continuação da sua formação objetivando a vida acadêmica. E é evidente, estes jovens não estão dispostos a ganhar salários miseráveis em ambientes de trabalho cada vez mais conturbados e estressantes.
Estas três áreas são as mais evidentes de uma realidade que se apresentará, em nosso entender, mais dramática a cada ano, exceção feita a língua portuguesa que mantém uma oferta razoável de professores a cada ano, as demais áreas do conhecimento tem cada vez menos pessoas sendo formadas com aquelas que se formam, em sua maioria não tem no magistério um fim profissional.
O quando se dará este apagão de fato não sei, mas se sabemos que apenas 37,5% dos alunos estão matriculados no ensino médio, ou seja, mais de 60% dos alunos em idade de escolar estão fora da sala de aula, se houver uma procura por matrículas, criaremos o cenário típico da surrealidade brasileira, alunos que desejam estudar em escolas que não tem professor.
Seria piada tal situação se não fosse ela  trágica, verdade é que estamos próximos de não termos mais professores, ao menos em algumas áreas do currículo, o poder público até hoje não estabeleceu uma unica política pública objetivando reverter este quadro, mas caro leitor, não se impressione, quando uma autoridade estadual e/ou federal vir a público indignada com a situação e do alto de seu cinismo propor uma saída milagrosa que não dará em nada e ainda encontre um culpado por tudo.
Sem salários dignos, sem políticas públicas que garantam uma carreira compensadora para o magistério, não haverá esperança, nem para nós e muito menos para nosso filhos e netos.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Sete anos de tormento

As últimas pesquisas divulgadas revelam um quadro inalterado nos últimos anos, o brasileiro passa em média apenas 7 anos na escola. O representa este número? Se pensarmos que o mínimo de anos para uma escolaridade razoável são de 14(!) anos, é desesperador imaginarmos que a maioria dos brasileiros fica metade deste tempo estudando. Algumas perguntas são pertinentes e cabíveis: 1- Por quê se passa tão pouco tempo na escola brasileira? 2- O que estas crianças e jovens fazem ao abandonar a escola, vão trabalhar? 3- Que papel, ou onde estão os país destes jovens que ficam fora da escola? 
Responder estas perguntas é poder enfrentar uma realidade, e ao mesmo tempo pode explicar boa parte das nossas mazelas sociais, não tenho eu a pretensão de responder estas questões aqui, mas seria de bom grado poder ouvir dos atuais candidatos a governador e presidente o esperam fazer a respeito, fato é que ouço todos os dias no horário eleitoral ao menos aqui em São Paulo a ladainha da escola em tempo integral, como pedra de toque para resolver os problemas da escola. Coloco uma questão: não seria a qualidade da escola o problema primeiro a ser atacado? E quando falamos em qualidade falamos em discutir coisas como, currículo escolar, metodologia de ensino, material didático, remuneração e formação de professores?
Se não for feito nada rapidamente acredito que os analfabetos funcionais, os sem-escola, que hoje criamos aos milhares, aos milhões, acabem por aprofundar a minha certeza de que o futuro não pertence a nós, mas sim a barbárie, ou alguém tem dúvidas de que esta massa, desprovida de educação, cedo ou tarde se voltará contra a sociedade e cobrará o preço da sua exclusão?

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

A escola hoje é melhor

Desde que consiga recordar, sempre o senso comum afirmava que a escola do passado era sim uma boa, aquela escola em que estudei e todos aqueles que tem mais de 40 anos como eu, mas o que tipo de escola era esta que os saudosistas sempre relembram, e toda vez que se deseja lembrar como a escola, os professores e os alunos eram tão melhores que os hoje.
Ora esta escola dos anos 1960, 1970 era um lugar chato, burocrático, profundamente autoritário e revestido de uma arrogância insuportável, de professores e diretores. Antes que digam que é exagero, vale lembrar que esta era uma escola pública, porém elitista, branca, alva e pequeno burguesa, assim como seus professores e seus diretores. A ordem, o silêncio, a devoção ao professor que escondia o medo, medo de ser posto contra a parede, ser humilhado por palavras duríssimas. E eu vivi isto tudo na minha escola.
A escola hoje tem um sem fim de problemas abomináveis, mas pensar que o passado era melhor, ledo engano, uma escola para ser boa precisa de muitas coisas, e aquela que estudei não tinha muitas qualidades, e dentre todas que faltavam eu ressaltaria a sua condição aborrecida, sim a escola era um lugar de adultos, para adultos em miniatura, nós os alunos, eu deseja apenas ser criança, e isto decididamente a escola não me permitia.
Hoje é fundamental tornar a escola algo infinitamente melhor, mas se não soubermos dar evidência aquilo que há de bom hoje, e existe muita coisa, corremos o risco de fazermos uma escola pior do que antiga e mais ruim do que hoje.

Eleições, educação e demagogia

Em todas as eleições é sempre a mesma coisa, não há um único candidato, a qualquer cargo que não seja um defensor da educação, em especial nos cargos majoritários, isto é o dizer de todos. Curioso é saber que o modelo educacional brasileiro é um caos, é ruim, muito ruim, e todos sabem disto. Na prática é uma escola feita de remendos e acertos de ocasião. E o que nós fazemos a respeito, pouco, muito pouco, em verdade creio que o nosso nível de tolerância é altíssimo, na mesma medida que somos coniventes com a elite política.
É possível que boa parte destes demagogos seja eleita e perpetue a sua vocação demagógica, falando de educação e fazendo "trem bala", é simples assim, o poder político elege um discurso, a educação, e coloca o dinheiro em outro lugar, mais visível ao eleitor e de rápido efeito publicitário.
Creio que unica maneira de se fazer algo diferente seja a constituição de câmaras de educação em municípios e estados de forma a se poder intervir diretamente na política educacional do estado. Estas câmaras deveriam ser permanentes, publicas e deliberativas.
Um segundo caminho é constituir uma carreira para o magistério público, é risível a vida dos professores nas escolas, a disparidade absurda dos salários e a falta de perspectiva de ganhos dignos afastam todos os dias os professores da sala de aula, um exemplo, 46% dos professores em sala de aula no estado de São Paulo, o mais rico do país, são temporários, os titulares ou se licenciaram, ou simplesmente não há professor disposto a trabalhar pelo que se deseja pagar.
Dante Donatelli